
No âmbito da sua visita a Portugal, Leah Mansoor, Vice-Presidente de Business Development da Wawiwa Tech, passou por Lisboa para conhecer de perto as instalações e a equipa da TechOf. A visita marcou mais um passo na relação de proximidade entre as duas entidades, que partilham uma visão prática, eficaz e orientada para o mercado no que toca à formação tecnológica.
Na Wawiwa, Leah Mansoor lidera a expansão da rede de parceiros globais, ajudando centros de formação tecnológica em todo o mundo a implementarem programas “job-ready”, ou seja, alinhados com as reais necessidades do mercado de trabalho.
A Wawiwa é, precisamente, a parceira estratégica da TechOf no desenvolvimento dos programas que leciona. Esta colaboração garante que cada curso é construído com base no método JET (Job-Effective Training), que alia competências técnicas, conhecimento conceptual e competências transversais, preparando os alunos para uma entrada bem-sucedida no mercado de trabalho.
Durante a sua visita, a VP de Business Development da Wawiwa partilhou connosco a sua visão sobre o futuro das profissões tech, o impacto da inteligência artificial, a importância da aprendizagem contínua e o papel que Portugal pode assumir no ecossistema tecnológico global. A entrevista que se segue é o resultado desta conversa.
Nos últimos anos, assistimos a uma rápida evolução das ferramentas de Inteligência Artificial generativa. Na sua opinião, que impacto terão estas tecnologias nos perfis tecnológicos júnior, sejam recém-licenciados ou profissionais requalificados?
Neste momento, o mercado está a tentar perceber o verdadeiro impacto da inteligência artificial. Aquilo que se observa é que há tarefas muito específicas, especialmente as mais repetitivas, que podem ser realizadas de forma mais eficiente pela inteligência artificial. Isso significa que até mesmo as funções júnior em tecnologia estão a sofrer alterações. Tradicionalmente, os perfis júnior eram responsáveis por essas tarefas mais básicas e rotineiras no início da sua carreira.
Hoje, já se espera que parte dessas tarefas possa ser automatizada por inteligência artificial, sendo supervisionadas por alguém mais experiente. A verdade é que, atualmente, qualquer pessoa que entre para um cargo júnior ou de trainee tem de ter já alguma noção do que é a inteligência artificial e saber utilizá-la. É mais uma competência que precisam de trazer consigo.
Não podem chegar a uma entrevista de emprego sem qualquer noção do que são as ferramentas de inteligência artificial. Portanto, isto está a alterar a própria definição do que é um cargo júnior. Claro que continuam a existir posições júnior, ninguém entra no mercado já como sénior. Há que percorrer esse caminho. Mas está a mudar o que se espera de um júnior, e todos os programas de formação tecnológica têm de ser adaptados a esta nova realidade.
Existe o risco de estes cargos júnior serem mais automatizados? Ou os perfis júnior terão de vir preparados com um novo conjunto de competências?
Não se trata de uma questão de “se”. É um facto. A função está a mudar. A expectativa do que se deve trazer para um cargo de entrada está a mudar. E não é só na tecnologia. Vemos o mesmo no marketing. Hoje em dia, quem entra numa função de marketing tem de saber usar inteligência artificial.
O mesmo acontece na criação de conteúdos. Já não se espera que cries tudo do zero, mas que saibas usar a inteligência artificial para otimizar esse processo. Estas são as novas expectativas.
Portanto, as posições júnior vão continuar a existir, mas os candidatos têm de trazer novas competências. Precisam de saber como usar a inteligência artificial a seu favor, de forma eficaz, para poupar tempo. Trata-se de uma transformação no conteúdo do trabalho, na definição do que é esperado, mas continua a ser uma função júnior.
Na sua opinião, que competências humanas continuarão a ser indispensáveis?
O pensamento crítico e a criatividade continuam a ser essenciais. A inteligência artificial é, no fundo, um modelo. Usa imensa informação e pode parecer criativa, mas está sempre limitada pelo que o modelo conhece. O ser humano traz algo que a inteligência artificial tem dificuldade em replicar: empatia, sensibilidade, pensamento crítico.
E não podemos esquecer que a inteligência artificial nem sempre diz a verdade. É crucial manter um olhar crítico. A inteligência artificial não nos substitui, mas altera o modo como trabalhamos. Como já disseram: não é a inteligência artificial que vai roubar o teu trabalho, é alguém que sabe usá-la.
As funções estão a redefinir-se e vão surgir novas profissões que nem imaginávamos, tal como aconteceu com a criação de conteúdos ou a possibilidade de ser um influencer no TikTok. A inteligência artificial também vai criar novas profissões e alterar as competências exigidas até nas funções mais tradicionais.
Perante esta transformação, o que devem as instituições de ensino e centros de formação tecnológicos fazer para preparar os alunos?
O que fazemos na Wawiwa, e o que a TechOf também implementa, é começar por integrar a inteligência artificial como uma competência transversal em todos os programas. Não a ignoramos, incorporamo-la.
Por um lado, mostramos como a inteligência artificial pode ser usada em cada profissão; por outro, utilizamos as próprias ferramentas de inteligência artificial nos programas para tornar a aprendizagem mais eficaz. Por exemplo, nos programas de front-end developer introduzimos recentemente um botão com verificação por inteligência artificial: os alunos escrevem código e recebem feedback imediato.
Não substitui o formador, mas acelera o processo. Em vez de esperar, o aluno pode avançar mais depressa. É necessário integrar a inteligência artificial tanto nos conteúdos como na metodologia de ensino, e estamos a ajustar os nossos programas, passo a passo, para isso.
Estes princípios estão integrados na metodologia JET. Pode explicar como surgiu esta abordagem e como é aplicada ao contexto corporativo?
JET significa “Job Effective Training”. A ideia é perceber bem o que exige uma determinada função e construir o programa com base nisso. Dividimos o conteúdo em três camadas:
- Tecnologia – é o menos importante, embora essencial. É o conjunto de ferramentas e linguagens específicas da função.
- Conceitos – princípios como Agile, ou design de interfaces, que não mudam muito ao longo do tempo.
- Competências – soft skills que são específicas de cada função. Um analista de dados, por exemplo, precisa de pensamento crítico e de saber traduzir dados em dashboards; um developer precisa de trabalhar em equipa e de saber interpretar as necessidades do cliente.
Falamos com profissionais do setor para desenhar programas eficazes. Queremos formar profissionais “job ready” no menor tempo possível, mas sem comprometer a qualidade.
Após colocarmos os alunos no mercado, avaliamos se o programa foi eficaz. Se necessário, voltamos atrás e ajustamos. Foi o que aconteceu com a inteligência artificial: só a integrámos quando o mercado passou a exigir esse conhecimento.
E acredita que a aprendizagem ao longo da vida será uma constante?
Sim, a não ser que o mundo pare de evoluir, o que não vai acontecer. A aprendizagem contínua é essencial. Ter vontade e capacidade de aprender sozinho é uma das competências mais importantes em tecnologia.
Qual é a principal diferença entre a Wawiwa e outros bootcamps ou centros de formação tecnológica?
Para nós, não se trata de um curso, mas de um programa. O objetivo não é apenas formar, mas garantir que o aluno encontra emprego.
Por isso, o programa inclui apoio à empregabilidade, preparação para entrevistas, orientação de carreira, ligação às empresas, e começa logo por avaliar se aquela área é adequada ao perfil do aluno.
É um programa realmente prático, com metodologia ágil, sem testes teóricos, apenas projetos reais que constam no portefólio desde o início. Tudo culmina num projeto final que integra todos os conhecimentos adquiridos.
Os nossos parceiros, como a TechOf, envolvem diretamente o setor. Convidam empresas para webinars, apresentações, sessões de feedback. Isso aproxima os alunos do mercado.
Outro ponto diferenciador é a variedade de programas. Não oferecemos apenas programação, temos um portefólio muito vasto, desde análise de dados até design gráfico e cibersegurança. Isso permite uma orientação mais personalizada para cada aluno.
Falando agora da parceria com a TechOf, como surgiu e porquê Portugal?
Fomos apresentados por um contacto comum. Conhecemos a equipa e houve empatia imediata. São profissionais experientes, com vontade de construir algo sólido, não um projeto rápido.
Nós, na Wawiwa, também somos uma equipa sénior, com experiência em formação. Partilhamos valores e criámos uma parceria win-win.
Portugal, sendo um país europeu em crescimento, tem escassez de talento tecnológico. E há uma vantagem enorme: a aceitação do inglês. Ao contrário de França ou Alemanha, aqui é mais fácil usar materiais em inglês, mesmo com formadores portugueses. Isso facilita a entrada no mercado.
O que destacaria no trabalho da TechOf até agora?
Estão a fazer um trabalho notável. Foram dos poucos parceiros que optaram por ensino presencial e investiram num espaço incrível.
A TechOf também conseguiu algo único: um modelo híbrido muito eficaz, em que o formador dá aulas presenciais e online em simultâneo, que é algo muito difícil. A tecnologia implementada torna tudo natural. Pretendemos replicar este modelo com outros parceiros.
Têm também uma excelente equipa de formadores e os alunos estão a conseguir emprego. Em apenas dois anos, já criaram uma marca própria e começam a destacar-se no ecossistema tecnológico nacional.
Como avalia o ecossistema de talento tecnológico em Portugal, nacional e estrangeiro, e a recetividade a modelos de formação prática?
Existe uma grande procura por talento tech, tal como noutros países. Mas também há uma fuga de talentos para mercados com melhores salários. É fácil circular dentro da Europa, por isso o desafio mantém-se.
E que soluções propõe a Portugal para combater esse problema?
A aposta em talento tecnológico tem impacto na economia. Não se trata só de preencher vagas, é sobre gerar inovação local, criar novas empresas, atrair investimento e fazer crescer o ecossistema.
Vejamos a Índia ou a China: durante anos foram centros de outsourcing, mas esse talento acabou por criar as suas próprias startups. Hoje, têm ecossistemas independentes dos EUA.
Portugal não deve depender de talento remoto. Se atrai profissionais internacionais, por exemplo, deve criar condições para que fiquem e contribuam para a economia nacional. E, às vezes, começar numa posição menos favorável permite dar um salto mais rápido. Portugal tem abertura para inovar, o que o coloca numa posição privilegiada para crescer depressa.